Participei em 2016 da 42ª edição do CONARH (Congresso Nacional de Recursos Humanos) e lá pude assistir palestras bastante inspiradoras. Uma delas, em especial, chamou a minha atenção. Foi ministrada pelo executivo Ricardo Vescovi, presidente de uma companhia que eu mal conhecia e foi convidado para falar sobre a importância da gestão baseada em valores durante crises empresariais.
Como tenho por hábito tomar notas das apresentações que testemunho, naquela oportunidade registrei algumas frases ditas por ele que vale a pena compartilhar com você:
– “Os valores centrais da nossa empresa são a integridade, o respeito às pessoas (de dentro e fora da companhia) e a mobilização para os resultados”.
– “Na crise é necessário construir confiança e o diálogo é a principal ferramenta para isto acontecer”.
– “Os gestores organizacionais precisam entender que as crises exigem o protagonismo da liderança. Isto é, você não pode correr da responsabilidade de conduzir o time”.
– “Quando alguém busca transparência e abertura, a boa reputação é uma consequência. O simples eco daquilo que você faz”.
– “Ninguém fala em valores no nosso mercado de atuação, mas nós levamos este assunto a sério. Podem nos visitar para verem de perto”.
Ao final, fiz questão de cumprimentá-lo e dizer que foi um prazer escutar alguém que parecia realizar um excelente trabalho. Ele, dócil, agradeceu as minhas palavras e logo passou a dar atenção para inúmeras outras pessoas que também queriam lhe falar, inclusive jornalistas de diferentes veículos. Confesso que fiquei com vontade de conhecer seu trabalho de perto.
Ele voltou a receber a minha atenção – e a do mundo todo, infelizmente – a partir do dia 05 de novembro, quando 40 bilhões de litros de rejeitos de minério de ferro da empresa que dirige desceram o Rio Doce por 500 km até atingirem o litoral do Espírito Santo, matando ao menos 15 pessoas e destruindo tudo o que estava no seu caminho. Sim, o Ricardo Vescovi é presidente da Samarco.
Na última quinta-feira, depois de inúmeros pedidos de entrevista rejeitados, a Folha de S. Paulo publicou as 25 perguntas que gostaria de lhe fazer e até agora não pôde. Entre as questões: “A Samarco se considera responsável pelas mortes de trabalhadores da empresa e de moradores de Bento Rodrigues, em Mariana?”, “A Samarco nunca se incomodou com tanta gente morando perto de uma estrutura que depois se mostrou vulnerável?”, “Por que a Samarco tem tomado medidas quase sempre a conta-gotas e apenas após a pressão da Justiça, prefeituras, órgãos ambientais e Ministério Público?” e “Por que a empresa demorou tanto para pedir desculpas pela tragédia?”.
É fácil pregarmos a transparência e tantos outros princípios socialmente aceitos; o difícil é ser transparente quando as coisas não saem conforme planejamos. Por isso, quem realmente leva a sério um modelo de gestão fundamentado por valores, sabe que muitas vezes tem de tomar decisões que trazem prejuízos financeiros aos negócios e pedir desculpas quando erra, pois prefere fazer o que é certo em vez daquilo que é conveniente.
O momento mágico da Samarco praticar o diálogo, a simplicidade, a transparência e o protagonismo – pilares da gestão baseada em valores, segundo palavras do seu próprio presidente – é este. E daí, o que acontece? Até agora desconhecemos a causa da ruptura da barragem (uma informação elementar), ninguém fala com a imprensa e parece que a empresa não tem comando.
Palestrante e consultor empresarial especialista em Formação de Lideranças, Desenvolvimento Gerencial e Gestão Estratégica, também é professor universitário em cursos de pós-graduação. Mestre em Administração de Empresas, possui MBA em Gestão Estratégica de Pessoas e é autor dos livros “Líder tático” e “O gerente intermediário”, ambos publicados pela Ed. Qualitymark.