Na época em que ingressei na universidade, recordo-me bem de um professor de meia-idade que tinha por hábito levar suas anotações num caderninho que já estava amarelado pelo tempo de uso. Como esse fato chamava a atenção de todos, certo dia um colega escondeu o material de apoio do professor para ver o que acontecia. Simplesmente não houve aula. Ele ficou tão desconcertado por não ter seus registros à mão – pensou que havia esquecido o caderninho em casa –, que liberou todo mundo sem pensar duas vezes.
É claro que o comportamento desse aluno não foi adequado – ele mesmo se arrependeu logo depois de ter feito a traquinagem –, mas o estrago foi inevitável. A partir daquele evento, o professor perdeu o pouco de credibilidade que havia conquistado desde o início das aulas. Teve de lidar com o desinteresse da turma até o final do semestre letivo.
A ilusão do conhecimento é um tipo de equívoco que pode atingir qualquer um de nós. Muitas pessoas com baixa formação, por exemplo, se recusam a estudar por acreditarem que alguns anos a mais nos bancos escolares não mudarão suas vidas de verdade e o que já sabem é suficiente para tocarem aquilo que têm. Todos conhecemos algum familiar ou amigo que pensa assim.
Por outro lado, existem pessoas que cursaram faculdade, fizeram uma boa pós-graduação e também sofrem dos mesmos sintomas. O erro delas é acreditar que os diplomas são mais do que suficientes para uma carreira sem percalços ao longo do tempo.
O conhecimento é um bem cujo prazo de validade tem sido cada vez menor. Como as coisas mudam muito rapidamente, aquilo que você aprendeu ontem e não usa hoje, pode virar saber inútil amanhã. É por isso que, mais do que acumular informação, precisamos encontrar formas de fazer com que nossa bagagem cultural e técnica sirva para alguma coisa.
Ultimamente, algumas pessoas têm descoberto que foram “fisgadas” por esse tipo de mal, porque precisaram participar de processos seletivos e ninguém quis contratá-las. Uma delas, inclusive, me confidenciou: “Durante muito tempo acreditei que fosse um profissional de ponta – e fui mesmo -, mas nas últimas semanas descobri que parei no tempo. Já não sou o tipo de gente que as empresas estão buscando e não sei o que fazer no curto prazo para reverter a minha situação”. A ironia dessa história é que a pessoa em questão trabalhou nos últimos 20 anos recrutando trabalhadores no mercado.
É muito difícil criar uma receita para não cair na ilusão do conhecimento, mas algumas coisas são óbvias. Quem lê bons livros, costuma conversar com pessoas que têm algo a contribuir, participa dos principais eventos do seu setor de atuação, visita empresas que adotam as melhores práticas do mercado e continua a participar de processos seletivos (ainda que satisfeito com o trabalho atual), tem mais condições de saber realmente em qual nível está. No mínimo, não é pego de surpresa.
Também vale a pena lembrar: se você mantém a curiosidade aguçada, o hábito de se colocar em situações de desconforto justamente para aprender coisas novas, fica motivado quando está diante de um projeto complexo e recebe feedback diário do seu líder, então é provável que esse problema não o atinja.
A ilusão do conhecimento não afeta apenas pessoas, ela chega a ser um traço cultural de empresas que durante um longo período dominaram seu mercado de atuação, mas pararam no tempo e já não conseguem ver que estão alheias àquilo que acontece ao redor. São companhias que optam pela arrogância e tradicionalismo, quando poderiam prosperar novamente se mantivessem o mesmo espírito que as fez chegar ao topo no passado.
Palestrante e consultor empresarial especialista em Formação de Lideranças, Desenvolvimento Gerencial e Gestão Estratégica, também é professor universitário em cursos de pós-graduação. Mestre em Administração de Empresas, possui MBA em Gestão Estratégica de Pessoas e é autor dos livros “Líder tático” e “O gerente intermediário”, ambos publicados pela Ed. Qualitymark.