– Bom dia. Eu vim na empresa hoje apenas para pedir a minha demissão.
– Mas, como assim? Aconteceu alguma coisa? Você está conosco há apenas dois dias!
– É que eu já percebi que esse lugar não é para mim. Não é o que eu quero. Só isso.
É preocupante o número de pessoas recém-contratadas que pedem demissão de seus novos empregos sem mais nem menos. E o surpreendente é que isso também ocorre quando elas trabalham numa empresa com boas perspectivas futuras e líderes razoáveis. Simplesmente, algo as desencanta logo nos primeiros dias e tomam o caminho de casa.
No fundo, esse tipo de comportamento não é restrito ao mundo do trabalho. Você deve ter algum conhecido que se casou e alguns meses depois já estava separado devido a “incompatibilidade de gênios”. Aliás, tem muita gente que junta as escovas já pensando na possibilidade de cair fora se as coisas não caminharem do jeito que idealizam.
Isso tudo me faz lembrar de Zygmunt Balman, sociólogo e filósofo polonês que defendeu o conceito de sociedade líquida para explicar muitas das coisas que acontecem hoje em dia. Segundo ele, o ritmo incessante das transformações tem gerado tantas angústias e incertezas, que a nova lógica do mundo leva as pessoas ao individualismo e ao consumo desenfreado. Aliás, uma dica: sobre esse assunto, recomendo a leitura de “Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos” (Ed. Zahar), best-seller do próprio Bauman.
[su_pullquote align=”right”]Profissionais movidos pela ansiedade, impaciência e a busca de soluções instantâneas – também chamados de “Geração miojo“.[/su_pullquote]
Quanto ao dia a dia da sua empresa, creio é preciso ter em vista três coisas:
– Muitas pessoas já não entram mais de cabeça no trabalho
O principal escudo que vários profissionais têm usado para se proteger das frustrações é o baixo engajamento com as empresas nas quais trabalham – especialmente quem acabou de ser contratado e carrega decepções de empregos anteriores. “Já que pode não dar certo, então também não vou ficar criando expectativas”, costumam dizer. É aí que um bom propósito faz a diferença: ele ajuda as pessoas a “se jogarem” sem medo do futuro.
– Existe mais gente interessada em se conectar do que em construir relacionamentos
As novas tecnologias tornaram o mundo menor para cada um de nós, afinal é possível contatar gente do mundo todo, sem intermediários e de modo fácil. O lado ruim dessa história é que as pessoas agora têm preferido estabelecer conexões rasas – vide o grande número de “amigos” que temos nas redes sociais – a criar vínculos sólidos com as pessoas que, apesar de próximas, causam chateações. A consequência disso é que os conflitos aparecem e, em vez de tratá-los, muita gente logo deleta o chefe, o colega de trabalho, o cliente…
– Satisfazer os desejos virou regra
Como você age quando apresenta uma ideia e ela não é bem aceita pelas pessoas? Você continua a lutar ou simplesmente desiste de levá-la adiante? Profissionais movidos pela ansiedade, impaciência e a busca de soluções instantâneas – também chamados de “Geração miojo” – têm preferido a segunda opção, infelizmente. Por isso, uma dica: procure enxergar os pequenos progressos que você e as pessoas da sua equipe precisam alcançar nas próximas semanas, antes de cumprirem a grande meta de longo prazo. Vivemos tempos nos quais comemorar sucessos menores é um combustível e tanto.
Tenho a oportunidade de trabalhar com gestores que me perguntam: “Onde foi que eu errei? As pessoas não estão comprometidas na medida que precisamos”. O que digo a eles geralmente é que, sem a consciência de que geram um impacto positivo mundo, um ambiente de trabalho que ajude a criar fortes vínculos entre os indivíduos e desafios de curto prazo que sejam empolgantes, dificilmente manteremos pessoas engajadas.
E é claro, contrate as pessoas certas. Se, mais de uma vez, teve gente que pediu demissão com poucos dias de trabalho, é hora de rever o processo de seleção da sua companhia. Certamente, existe alguma coisa errada.
Palestrante e consultor empresarial especialista em Formação de Lideranças, Desenvolvimento Gerencial e Gestão Estratégica, também é professor universitário em cursos de pós-graduação. Mestre em Administração de Empresas, possui MBA em Gestão Estratégica de Pessoas e é autor dos livros “Líder tático” e “O gerente intermediário”, ambos publicados pela Ed. Qualitymark.